quarta-feira, abril 23, 2008

Os funcionários (texto de Abril de 2007)

Vive-se hoje no nosso país uma situação de perseguição como julgo não há memória. Pessoalmente, como nasci em 1973, não assisti às perseguições do regime anteriores ao 25 de Abril.Tive a sorte de crescer com a democracia, acompanhando-a lado a lado e sempre me senti livre. Foi necessário chegar aos 33 anos para começar a sentir um tipo de opressão, que vai fazendo duvidar sobre esta nossa democracia. Sim, eu sou funcionário público! Essa raça que, de um momento para o outro, se tornou a encarnação do mal. Actualmente, a perseguição que está a ser feita aos funcionários públicos é quase comparável às perseguições feitas por alguns regimes ditatoriais, e os meios usados pelo regime são os mesmos: uma máquina de propaganda bem montada que aos poucos consegue chegar à mente das pessoas até levar a uma paranóia colectiva. Perdoem-me os leitores a comparação, mas é realmente deste modo que me sinto. A propaganda e a perseguição que este governo está a fazer aos funcionários públicos quase me leva a acreditar que nos podiam juntar todos nos campos de futebol construídos para o Euro 2004 (esses monumentos à competência e capacidade de gestão dos nossos governantes) e gasearem-nos; deste modo, de um dia para o outro, o país ficaria livre destes seres desprezíveis que são os funcionários públicos. Não discuto a necessidade de efectuar reformas na Administração Pública. Aliás, como funcionário público, sou o primeiro a considerar que são necessárias. Mas as reformas devem ser feitas de maneira pró-activa, envolvendo as pessoas que serão os agentes dessas reformas. Não acredito em reformas que impõem o medo, a desconfiança e a prepotência. Foram estes senhores que agora se anunciam como os grandes reformistas da administração pública e da segurança social que criaram, ainda não há muitos anos, um sistema que permitiu a milhares de pessoas reformarem-se antecipadamente, acumulando, na maior parte das vezes, essas reformas antecipadas com o salário. Foram estes mesmos senhores que engrossaram de modo leviano os quadros da administração pública. Foram estes mesmos senhores que afirmaram a sustentabilidade da Segurança Social por mais cem anos. E são estes mesmos senhores que hoje assobiam para o ar e anunciam medidas como redução de férias, aumento do horário de trabalho, redução de comparticipações nas despesas de saúde, aumento das contribuições para a ADSE, aumento da idade da reforma, e até mesmo medidas tendentes à diminuição de salários. Há um limite para a falta de vergonha, mas parece que «vergonha» é uma palavra que não consta no vocabulário destes senhores que conseguem transformar coisas ridículas e mesquinhas em feitos nacionais; basta um computador e o Power Point e transforma-se a redução de algumas décimas nos processos pendentes nos tribunais numa vitória contra o “monstro”.Revoga-se um conjunto de medidas administrativas, dá-se-lhe um nome bonito e com boa sonoridade (Simplex) e já está mais um número de circo para animar a comunicação social. E o que dizer de um Primeiro Ministro que parece que não existe? Até é fácil compreender os índices de popularidade do Primeiro-ministro: são tal e qual como os índices de popularidade associados aos Ministros dos Negócios Estrangeiros que, como não têm grande intervenção na política interna, mantêm normalmente a sua popularidade em alta. Assim é com o nosso Primeiro-ministro, que não se dirige ao país para falar, por exemplo, das questões relacionadas com o fecho de Urgências, ou para falar das medidas previstas na reforma das carreiras e remunerações da função pública. Temos sim um Primeiro Ministro «Estrela», que só aparece e que só se dirige ao país quando os técnicos de imagem e comunicação acham conveniente, ou seja, quando uma qualquer estatística dá para fazer uma apresentação bonitinha no Power Point.·
Pedro Martins
Funcionário Público
in barlavento.online.pt 5 de Abril de 2007 12:07

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